Matérias ilustrativas:
Cotas para negros
Cresce a consciência da dívida social e moral que a Nação e o Estado brasileiro têm com os negros, descendentes dos escravos. A República, ao ser implantada, não executou o projeto da monarquia em doar terras ao longo das estradas de ferro aos que foram libertos pela áurea, assinada pela princesa Isabel. Simplesmente omitiu-se, abandonando-os à própria desventura. Sem terra, sem escolaridade e sem nada, os negros foram obrigados a viver em favelas e a executar, até com heroísmo, serviços e trabalhos conforme as mínimas possibilidades de sua condição social, ou a cair na marginalidade do vício, do ócio ou da contravenção. Aumentaram o contingente de empobrecidos, brancos e mestiços. Assim se exacerbou a divisão de classes na qual se constituem, ainda hoje, os pobres mais pobres. O problema se agravou pela concentração de renda devido aos baixos salários e o processo inflacionário que acompanhou nossa economia durante todo o século XX. No entanto, salvo exceção, muitos conseguiram ascender, através do esporte e da arte. Esta breve explanação do fenômeno social é causa e efeito, num círculo vicioso, da pouca presença do negro nas instituições de ensino médio e superior, pois entra no ensino básico em grande desvantagem. Tais considerações prescindem de outras variantes importantes como o racismo, explícito ou velado, e a desestruturação familiar devido à escravidão e sua seqüelas como abandono das crianças negras pela lei do ventre livre. Trata-se de uma série vergonhosa de erros, equívocos e omissões. Portanto, o problema é estrutural. Há tempo compromete nossa democracia e cidadania.
EDITORIAL do jornal O Testemunho da Fé ( órgão oficial da arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro ). Ano XIII ( IV ) – nº 314 – edição semanal nº 162 – de 15 a 21 de fevereiro/04, p